terça-feira, 25 de setembro de 2012

Penso em TI




Olhas do chão a imensidão da queda que te levanta...
Penso em ti, a cada segundo que estou longe, sinto a ausência da tua presença, do teu olhar. O tempo passou e por vezes parece ter estagnado. Olho no espelho o meu reflexo, não me reconheço, não reconheço o espaço onde me encontro, não sei como vim aqui parar. Cansado de não ter descanso, de não encontrar repouso, desejado… tão desejado! Sentir teus olhos lavarem-me a alma, deparar-me com o teu sorriso e sentir a jovialidade da vida percorrer o meu ser. Continuo a caminhar, errante, por entre espinhos e falésias que me fazem duvidar da vida, da morte, do hoje e do amanhã.

O espelho retribui-me a imagem perdida de quem te procura e não encontra. Idos os tempos em que desfolhava teu véu, a mão no meu rosto a enxaguarem o suor da caminhada. Penso em ti, como não poderia deixar de pensar! Eu desejo o nosso reencontro, o nosso sonho. Na queda repentina que acolheu nos fetos o meu corpo, repousa a tua, a minha, a nossa vontade. Não consigo, olhar, ver o reflexo do moribundo que se levanta, se ergue apressadamente para voltar a cair, voltar a sentir o desconforto da dor, a que se impregna em todos nós no sofrimento desmedido. Não se resigna a desbastar-nos por dentro, por fora e a toda a nossa volta. Este estancou as feridas supérfluas enraizadas num continuum jorrar interno do sangue, dos órgãos e da alma mutilados na caminhada. Estendi, estendo, dou e recebo, a mão a quem me acompanha; percorremos os trilhos na esperança do encontro final, com a calorosa receção partilhada na alegria da superação de uma, duas, várias montanhas ultrapassadas.

Penso em ti… Penso no abandono forjado, vendido que desmembrando lentamente nos afastou de todos e de ninguém, consequentemente permitimos esta intromissão na nossa relação. Hoje, de frente a este espelho, desconfio e desconfias de mim, de ti e de todos os que passam na tua vida. As trocas sujeitadas a intermediação fria, gélida sem qualquer toque, calor humano; despertam o pior que temos dentro de cada um de nós. Se te amo? Amo! Amo-te como és, como virás a ser! Se te quero mudar? Provavelmente tentei faze-lo, repetidamente sem nunca alcançar esse objetivo. Como nos podemos relacionar? Respeitando, mas não no sentido superficial do termo, aceitando quem nós somos e como somos, respeitando o verdadeiro ser que habita em nós. Em ti penso por esta lição!

O teu rosto, simples arredondado e esguio, com os lábios num sorriso aberto, olhar franco e triste… Porquê essa tristeza? O que posso dar para a tristeza partir?

Olhos verdes, limpos abertos ao mundo que rodeia teu ser. Um olhar expressivo, comunicativo sem palavras proferidas no mais íntimo do ser. Sobrancelhas lisas, plenas de retidão no contorno das orbitas arredondadas. Penso nesses olhos, na majestade de suas vidas, nos horizontes desbravados, por espaços curtos do seu cintilar. Penso nas horas, saudosas de outros tempos de sorrisos despreocupados. Em teus olhos a esperança renasce na lembrança a vontade de ser e de estar, pleno sem qualquer outro condicionamento. Não nos ensinaram a sonhar, o suficiente, para sermos ousados no olhar que temos de ti, de nós… Era necessário termos aprendido que só procurando o respeito por nós poderíamos sonhar com um mundo melhor. Nos teus olhos vejo, a vida desfeita dos sonhos vendidos e comprados, dos sonhos que se auto inscrevem na não realização de um mundo extinguido do qual desejamos não fazer parte.

No espelho, o retrato de quem tu nunca viste, de quem nunca sonhaste, do que tu nunca desejas-te. O retrato de quem ambiciona e precisa de se erguer. De quem olha para si com os olhos estranhos e desconhecidos da obra incompleta e transfigurada dos outros, acomodada num pequeno invólucro sem abertura, sem portas, sem janelas que permitam a abertura e a comunicação, a troca, a partilha verdadeira das existências contidas nela. Em ti, pelo espelho, pela água, sei sem dúvida alguma, o momento prestes a chegar da revivescência dos sonhos construídos será mais forte, impossíveis de se conterem guardados, a mudança impregnará o que nos rodeia para um nova caminhada vigorosa ao cume da serra que diante de nós se apruma.

Queixo caído, ombros pesados, rosto anémico moribundo com aguaceiros refletidos, busca o alento emergente, contrário ao momento vivido. Em ti penso por seres a beleza que afaga o coração, a vida primaveril que permanece eterna, a criancice sempre tão desejada. De mãos abertas recebes os corpos mutilados, os que do chão já se levantaram. Em ti, em mim e nos demais ao nosso lado, caminham nutridos por um simples conforto no colo dado. Na esperança de nos encontrares, de nos encontrarmos, reinventados.

sábado, 22 de setembro de 2012

Porto, ao amanhecer